A questão filosófica levantada pelo Cristiano Ronaldo ao dizer: "Os golos são como o ketchup", querendo estabelecer a analogia que depois de sair um pouco sai tudo, acabou por nos mostrar o outro lado da moeda, que é o facto de depois de sair tudo não há mais nada lá dentro.
Cada vez mais sinto que apoiar a selecção portuguesa é um acto masoquista onde criamos uma ilusão por mais que a equipa desiluda, até ao ponto da desilusão total.
Ouvi choradeiras típicas de: "Ah e tal o golo foi em fora de jogo", "Ah e tal o espanhol fez teatro".
E então? O que importa tudo isso se a equipa nacional parecia um grupo de velhinhas cegas que não acertavam um passe? O que importa se o Espanhol se fez à falta esperando um cartão vermelho e um Óscar de melhor actor? A verdade nua e crua é que não marcámos um golo em 3 jogos pois borramos o prato todo com ketchup contra os Coreanos. É como o Tuga que compra uma palete de minis para os jogos do mundial e bebeu tudo durante o primeiro jogo... depois não há.
Os portugueses vivem de ilusões mas sabem que serão desiludidos.
Ilusão:
Viriato papava romanos ao pequeno almoço e por isso a Lusitânia nunca iria ser conquistada.
Desilusão:
Os romanos deram uns trocos a um Lusitano que matou o Viriato durante o sono.
Ilusão:
O primeiro Rei de Portugal queria tanto a independência que até entrou em guerra com a mãe.
Desilusão:
Afinal não foi com mãe, mas sim com o padrasto. E afinal nem queria ser Rei mas o Vaticano queria os mouros fora da Europa.
Ilusão:
Nunca fomos conquistados pelos Espanhóis.
Desilusão:
Afinal fomos um estado vassalo de Castela após o cerco de Guimarães, mas Xiiiiiiuuuu não digam a ninguém...
Ilusão:
Somos o maior império do mundo.
Desilusão:
Ups, lá se foi o império...
Ilusão:
A Républica irá resolver todos os problemas causados pela monarquia.
Desilusão:
Estamos fodidos.
Ilusão:
25 de Abril, sempre!
Desilusão:
Não falem no 25 de Novembro!
Ilusão:
O socialismo irá distribuir as riquezas pelo povo.
Desilusão:
Por que é que estamos cada vez mais tesos?
Ilusão:
A CEE é que é, agora até nos pagam para não trabalharmos.
Desilusão:
A dívida externa subiu 400% e se vendermos Portugal ainda ficamos a dever dinheiro.
Vivemos de ilusões. Todas as semanas achamos que vamos ganhar no lotto quando na verdade é mais fácil levar um tiro de um macaco que fugiu do Zoo e desarmou um policia durante a fuga.
A ilusão de que se há Jackpot, se jogarmos 6 boletins em vez de 1, temos mais probabilidades de ganhar, quando qualquer aluno do nono ano sabe que as probabilidades de vencer num jogo de 6 em 49 números é igual independentemente de fazer uma ou mil apostas.
Vivemos de ilusões. Ilusão de liberdade que sendo condicionada por regras sociais afinal não é liberdade. A ilusão de nacionalismo baseada num risco que fizeram no chão ao qual chamam fronteira. A ilusão de dever para com o Estado quando é o Estado que tem o dever de nos servir. A ilusão de autoridade policial ou politica, quando a autoridade é nossa e por ser nossa é que estes grupos a podem ter após ser dada por nós através do consentimento. A ilusão de encontrar o verdadeiro amor esperando que ele caia do céu e que seja na forma fisicamente perfeita de capa de revista photoshopada (do verbo photoshopar). A ilusão de felicidade quando nos condicionamos de forma a buscá-la em todo o lado excepto no único local onde ela pode estar... lá dentro bem no fundo do nosso ser.
No fundo, a maior ilusão é a de pensarmos que: tudo o que nos rodeia, tudo o que nos impõem, tudo o que nos dizem ser importante, é realmente importante para nós, quando ignoramos quem somos e que só a nossa importância é real.
Mas hoje durante 90 minutos nós fomos menos importantes do que nos outros dias, o importante era que 11 meninas mimadas pagas a peso de ouro, chutassem uma bola redonda para dentro de um rectângulo após passar por 11 meninas mimadas que vivem para lá do risco no chão a que chamamos fronteira. Amanhã haverá outra distracção que será ilusoriamente importante, e tudo para que nunca busquemos nada que realmente importe, nada que realmente nos beneficie, nada que nos surpreenda nem que seja por unicamente não nos desiludir.
E agora? Agora começa tudo novamente, o Euro está à porta!